Prontos para encarar a longevidade com independência financeira?

Rebecca Bloom é uma londrina com um péssimo hábito. É uma consumidora compulsiva. Apesar de ser jornalista especializada em mercado financeiro, não consegue controlar as próprias finanças. Qualquer coincidência é mera semelhança! Endividada até a alma, ela vive fugindo dos credores e criando fórmulas mirabolantes para pagar as contas. Esse é o enredo do livro  “Os Delírios de Consumo de Becky Bloom”, de Sophie Kinsell (Record, 2018), que também inspirou um filme.

E se as (os) Beckys da vida chegassem aos 50 com o mesmo comportamento?

É algo a se pensar já que o custo de vida, a partir de certa idade, tende a aumentar. E o que fazer para recuperar o tempo perdido e manter certa qualidade de vida após os 65, quando a baixa capacidade de gerar renda via trabalho declina? É do desejo de encontrar respostas para essa equação que nasceu a Bolso50+, startup ainda em fase de validação, mas que deve compilar dados interessantes sobre o comportamento financeiro dos maduros.

Para isso, seu fundador, Uri Levin, egresso da área de Investiment Bank, está à frente do projeto que especializa a gestão financeira para os maduros.  Assim, ele oferta uma primeira análise gratuitamente para quem deseja se organizar. “A ideia é criar uma base de dados para um aplicativo que ajude essa parcela da população a planejar um futuro mais tranquilidade”, conta.

É, de fato, algo que requer atenção.  Como já tratado aqui no artigo Longevidade do brasileiro implica num desafio econômico maior, é um planejamento essencial para não ficar dependente da ajuda de familiares, de amigos e até do próprio Estado. Assim, quanto antes se começar um programa de poupança, melhor.

Sabemos que é complicado guardar dinheiro com uma renda que, às vezes, mal cobre os custos mensais. E há de se levar em conta ainda que não são poucos os casos em que os papéis se inverteram e colocaram o aposentado como o único arrimo da família, diante do atual mercado de trabalho. Por isso, a ideia de Uri traz certa luz ao fim do túnel, ao encontrar brechas no orçamento, mesmo enxuto, para reduzir despesas fixas, além da educação para mudar os hábitos.

De grão em grão

Um exemplo clássico que ele cita, e que eu testei na prática, é a revisão do plano de celular. Ligar para as operadoras de telecomunicações, sempre exigiu muita paciência e certo jogo de cintura. Imagina, então, para quem desconhece o atendimento feito via Inteligência Artificial, que, na prática, ainda deixa muito a desejar diante das benesses todas prometidas pela tecnologia. Na minha experiência, a negociação com a operadora, resultou em maior velocidade de internet e redução de 50 reais na mensalidade. Ou seja, em 12 meses terei poupado 600 reais.

Mas para cortar gastos desnecessários é preciso, antes de tudo, detectá-los. É assim também com a nossa saúde financeira. Ao realizar essa avaliação, a gente se surpreende com o impacto que certos gastos desnecessários causam no orçamento.  

E tem muita coisa que dá para se abrir mão ou apenas deixar para depois.  Um jeito de, aos poucos, mudar aquele comportamento que ainda guarda resquícios de uma cultura de hiperinflação. Além disso, faz muito pouco tempo que as pessoas começaram a conscientizar sobre a velocidade da transição demográfica e se questionar sobre o que fazer com as dezenas de anos a mais de vida.

Acredito que pensar a respeito da longevidade envolve também uma maior consciência dos impactos e dos custos sociais e ambientais de tudo que consumimos no nosso dia a dia. Pode parecer pouco se analisado isoladamente, mas quando computado ao longo de uma vida é muito significativo.

O consumo consciente é um instrumento de bem-estar e não um fim em si mesmo. Parte da premissa de que devemos consumir para viver mais e não viver mais para consumir. É importante que os idosos, como consumidores, tenham claro o poder que tem ao fazer suas escolhas.

Um novo canal para fortalecer os conselhos municipais de São Paulo

Ao mesmo tempo em que tanto acontece, parece que nada de novo se apresenta no universo da transição demográfica e do envelhecimento. Mas não é bem assim. Histórias de vida são sempre bem-vindas e nos trazem inspiração não só para escrever, como para tomar decisões que farão a diferença na nossa existência. Mas precisamos replicar essas boas experiências de alguma forma. Foi assim, conversando com o jornalista Ricardo Mucci, um ativista da maturidade moderna como eu, que despertei para o tema da importância do papel dos Conselhos de Idosos.

A nossa conversa foi justamente para entender melhor o projeto dele que, embora recém- nascido, já está estruturado para ganhar corpo. Trata-se da Rede Amigo do Idoso de São Paulo-RAISP, que envolve 132 municípios com população acima de 50 mil habitantes.

Uma iniciativa aprovada e certificada pelo Conselho Estadual do Idoso de São Paulo e pela Secretaria de Desenvolvimento Social do Governo do Estado de São Paulo. E que tem a Umana, empresa do Ricardo, e a Fundação de Apoio à Pesquisa, Ensino, Tecnologia e Cultura (Fapetec) à frente. Algo possível porque a Umana é o embrião da UP Sênior, uma plataforma de comunicação especializada na temática da longevidade.

Entre as ações verticais que integram o projeto está o lançamento do canal de TV-web ViverAgora e da promoção da SêniorWeek; a largada dos workshops SêniorDigital e a estreia do SouDino.com, que será o protagonista de palestras, conferências e eventos. A estratégia está alicerçada na produção e difusão de conteúdos em formato de estudos, projetos, palestras, portais, cursos e vídeos.

O conceito macro é composto por três pilares: Comunicar. Incluir. Transformar.Entendemos que a qualidade da longevidade da geração sênior está diretamente ligada ao acesso à informação e ao conhecimento”,  conta Ricardo. 

A ideia é justamente atualizar e formar os Conselhos para conscientizar não só os idosos, mas toda sociedade da necessidade de discutir e implementar políticas públicas. Além disso, é preciso esclarecer para a população que os maduros superativos são exceção e não regra.

“Para a maioria a idade chega e há desafios que passam longe de bater recordes esportivos ou pular de paraquedas. São questões do dia a dia de quem enfrenta o envelhecimento na prática”.

Os conselhos funcionam como organização capaz de estreitar a relação entre o governo e sociedade civil a partir da participação popular em conjunto com a administração pública nas decisões regentes na sociedade. Um exercício de democracia na busca de soluções para os problemas sociais, com benefício da população como um todo.

Mas se os conselhos são tão fundamentais para desenvolvimento de áreas sociais porque o atual governo deu um passo atrás ao alterar seu funcionamento na esfera da União? É um retrocesso, de fato, como a maior parte das decisões que tem tomado o presidente Jair Bolsonaro.

Não à toa, a medida foi contestada pelo Grande Conselho Municipal do Idoso de São Paulo, presidido pela professora Marly Feitosa, que aprovou na sua assembleia da última semana Moção de Repúdio ao Decreto Federal 9893 de junho de 2019. Uma medida que desmontou o Conselho Nacional dos Direitos da Pessoa e criou um novo modelo que restringe a participação da sociedade civil.

Isso, contudo, não impede que os conselhos de âmbito municipal, permaneçam atuantes e contribuam para a definição dos planos de ação da cidade. Cada conselho atua de maneira diferente, de acordo com a realidade local. E, dentre as suas atribuições, inclui-se a defesa dos direitos dos cidadãos idosos.

Assim, mesmo quem ainda está longe da velhice também pode e precisa se mobilizar, inclusive participando desses conselhos. Muitos jovens ainda não veem que, quando lutam pelos idosos, acabam agindo em causa própria.

Os direitos que os jovens derem agora a essa população serão desfrutados por eles próprios no futuro.